Black Swan
Situado no álbum “Map of the Soul: 7”, além de ser um conjunto de canções que dissecam a alma humana, também é um álbum voltado para o grupo em si - representado pelo 7. Portanto, Black Swan representa uma reflexão introspectiva dos membros em relação a esse importante processo de produção musical em suas vidas.
Análise
O que seria de nós sem as músicas que ouvimos, sem os filmes que assistimos, sem os livros, pinturas e tantos outros meios pelos quais a arte se manifesta?
Ela contribui em nossas vidas em diversos aspectos, nos ajudando a não apenas enxergar a vida sob uma nova perspectiva, mas também a crescermos internamente.
Aprendemos muito por meio das experiências que as formas de arte trazem para a nossa existência. Se por um lado, enquanto apreciadores dela, a arte nos proporciona esses sentimentos, por outro, a arte é a motivação de vida de quem a produz e vive dela.
E o que aconteceria, então, se essa motivação se perdesse? É a partir desse ponto que Black Swan nos lança a sua reflexão.
[Faça a sua coisa
Faça a sua coisa comigo agora (2x)
Qual é a minha coisa
Qual é a minha coisa, me diga agora
Me diga agora
Yeah, yeah, yeah, yeah]
Nessa primeira estrofe, encontramos o eu lírico perdido, desesperado para que alguém [não mencionado na canção] faça algo. E por não estar mencionado, poderia ser qualquer pessoa.
Ele não sabe o que quer, o que ele deve fazer, e por isso questiona “qual é a minha coisa”, e o desespero chega a tal ponto que ele implora “faça a sua coisa / me diga agora”, para que alguém, qualquer que seja a pessoa, o elucide.
As constantes repetições desse apelo são vistas não apenas na primeira estrofe, como também no meio e ao fim da música, quase como se fosse um ciclo que se começa e termina com o eu lírico perdido. Pensando na perspectiva de quem produz música, seria como se ele estivesse constantemente procurando suas razões pelas quais ele produz.
[Ay, o coração não acelera mais
Quando eu escuto a música tocar
Tentando suspender
Parece que o tempo parou
Oh, essa seria a minha primeira morte
Que eu sempre temi]
[Se isso não puder ressoar em mim mais
Não deixar o meu coração vibrando mais
É assim que eu morro pela primeira vez, provavelmente
Mas e se esse momento for agora
Agora]
Nessas estrofes, notamos, a partir de algo já constatado na estrofe anterior, que o eu lírico não encontra mais razões pelas quais ele produz música, pois ele não se sente mais da mesma forma em relação a ela, uma vez que seu coração não acelera mais quando escuta a música tocar.
Para quem vive por isso, o artista, não ter mais amor por aquilo é como se ele experimentasse uma primeira morte. Na frase da bailarina Martha Graham, que está presente no primeiro quadro do MV de Black Swan, há essa exata mesma ideia trazida nessa estrofe, e ela diz que "Um dançarino morre duas vezes - uma é quando ele para de dançar, e essa primeira morte é a mais dolorosa"
[Apenas a batida do coração pulsa lentamente no meu ouvido
Bum, bum, bum
Mesmo se eu tentar me livrar disso, fica na minha boca
Pule, pule, pule
Não há uma música que me pegue mais
Eu grito um choro sem som]
Nesses versos, notamos aquelas percepções emocionais agora vinculadas às partes físicas, ou seja, como aquilo se manifesta no funcionamento do corpo do artista. É o coração que já não bate rápido, mas sim lentamente ao ouvir a música, mostrando que o artista não se sente mais da mesma forma.
E que, mesmo se ele tentar se livrar dessa sensação, lenta, ela ainda se manifestará de outra forma: ele gritará, mas, em silêncio. Assim, notamos o sofrimento contido do dele.
[Um oceano onde cada luz cai em silêncio
Yeah, yeah, yeah
Mais uma vez, eu seguro os meus tornozelos que perderam o caminho
Yeah, yeah, yeah
Não há um som sequer que eu escute
Yeah, yeah, yeah
Me matando agora, me matando agora
Você me escuta, yeah]
[Lentamente afundando como em um transe
Nah, nah, nah
Mesmo que eu lute, o chão está em toda a minha volta
Nah, nah, nah
Cada momento se torna uma eternidade
Yeah, yeah, yeah
Filme isso agora (2x)
Você consegue me ouvir]
Nesse refrão, é válido mencionar a referência à música Sea, que, inclusive, fala sobre as inseguranças do grupo dentre outras questões. Pensando no verso 1 do refrão, podemos vislumbrar a beleza de um oceano, com toda a sua riqueza, devido à luz que chega até o fundo.
Porém, o BTS traz à tona a ideia de que essa luz deu lugar a uma escuridão [silenciosa], onde o eu lírico se afunda como em um transe. Ou seja, comparando com o oceano, não é mais possível ver toda a riqueza que o artista sentia ao produzir suas canções, e ele se afunda nessa escuridão.
Mesmo que ele tente escapar, como visto na estrofe anterior, de nada adianta, pois ele está preso em si mesmo.
Além disso, vale destacar o trecho “filme isso agora”, que pode ser interpretado como uma crítica àquelas pessoas que se divertem às custas do sofrimento de outras, que querem apenas “mídia” em cima delas.
[Fundo
Yeah, eu acho que estou indo mais fundo
Eu fico perdendo o foco
Me largue agora, eu não quero
Eu prefiro ir até lá com os meus próprios pés
Eu vou correr e entrar
No lugar mais profundo
Eu vi a mim]
Nesse rap do J-HOPE, é possível compreender um ponto de virada, ou melhor, uma tentativa de reacender uma esperança no artista, para que ele largue da escuridão e tente: “me largue agora, eu não quero / eu prefiro ir até lá com os meus próprios pés”. Que, mesmo no mais profundo, o artista verá a si mesmo, suas razões pelas quais ele produz.
Ainda nessa ideia de ponto de virada, SUGA continua:
[Lentamente, eu abro meus olhos
Aqui é onde eu trabalho, meu estúdio
Mesmo que essas ondas violentas
Passem por mim com escuridão
Eu nunca vou ser arrastado para longe, nunca mais
Lá dentro
Eu vi a mim, a mim]
E é aqui que notamos essa esperança da volta do artista às suas sensações primeiras com a música. Ele está tentando novamente, apesar das “ondas violentas que passam por ele com escurdão”.
O artista está lutando para se encontrar, encontrar as suas motivações, através das experiências e das memórias com o seu lugar de trabalho. Mas, apesar disso, essa não é uma questão fácil.
Pensando na ideia da primeira morte, é como se ele tentasse ressuscitar, no entanto, esse não é um processo fácil. Tanto é que a música se encerra com o apelo da primeira estrofe de novo.
O último pre-chorus diverge do primeiro:
[Apenas a batida do coração pulsa lentamente no meu ouvido
Bum, bum, bum
Eu abro meus olhos, e na minha floresta eu
Pulo, pulo, pulo
Não há nada que possa me engolir
Eu grito com toda a minha força]
As ideias desse pré-refrão ainda refletem o que foi apresentado nos versos de J-HOPE e SUGA, com aquela esperança reacendida. Há uma tentativa, do artista, de se recompor, de finalmente abrir os olhos na escuridão da floresta e gritar com toda a sua força porque ele sabe que ama a música, tem as suas memórias e suas experiências que o guiarão.
Porém, como já dito, esse não é um processo fácil para quem tenta se reencontrar de novo, seja na música, seja em qualquer outro meio, pois mesmo diante de tudo isso, a canção ainda se encerra com o apelo e o desespero encontrados na primeira estrofe.